Ditadura dos streams: quando a busca por dopamina musical prejudica a arte

Nos últimos anos, temos testemunhado uma enxurrada de comentários vazios e desnecessários direcionados aos artistas musicais, afetando profundamente tanto os próprios criadores quanto o meio cultural como um todo. A questão que surge é: quem realmente gosta de música? Quem verdadeiramente aprecia e se deleita com o lançamento de um novo álbum?

Há uma crescente tendência de consumidores que, ao invés de apreciar a arte pela sua essência, exigem que os artistas moldem suas criações segundo as expectativas populares e os ciclos de tendências do mainstream. Esse fenômeno é especialmente prejudicial quando se trata de gêneros musicais menos comerciais, como o R&B, que é frequentemente desvalorizado por aqueles que não compreendem suas raízes e complexidade.

Recentemente, o lançamento do aguardado álbum “Dopamine“, de Normani, trouxe à tona essa discussão de forma bastante visceral. Após anos de espera e inúmeros obstáculos enfrentados com sua gravadora, Normani finalmente disponibilizou seu disco, que mistura R&B, pop e influências do hip-hop. O álbum representa uma manifestação autêntica da artista, indo além de sucessos comerciais anteriores e explorando novas vertentes musicais. Apesar disso, muitos críticos leigos e fãs exigentes têm condenado o trabalho por não ser “pop” o suficiente ou por não estar alinhado com o que eles desejam ouvir.

Normani, ex-integrante do Fifth Harmony, é uma promessa genuína do R&B, trazendo sensualidade e uma voz cativante que evocam as maiores tradições do gênero. Em suas entrevistas, ela expressa claramente seu desejo de criar música que reflita sua verdadeira identidade artística. Em resposta às críticas, Normani desabafou: “No final das contas, eu posso fazer o que eu quiser, porque todo mundo sempre terá algo a dizer que tem algo errado com isso”. Suas palavras revelam a tensão constante que artistas enfrentam ao tentar equilibrar autenticidade e popularidade.

É importante notar que essa pressão para atender às expectativas do público não é um fenômeno novo, mas a era digital e a prevalência das redes sociais exacerbaram essa dinâmica. A indústria musical, com sua obsessão por reproduções e streams, contribui significativamente para essa cultura de mediocridade, onde o valor de uma obra é medido puramente por números e não por seu mérito artístico.

Os jovens, muitas vezes com pouco conhecimento sobre ritmos históricos como o R&B, rapidamente descartam esses gêneros por não se alinharem ao que é popular no momento. Isso cria uma monocultura musical, onde a diversidade e a riqueza dos diferentes estilos são substituídas por uma homogeneidade entorpecente. A falta de apreciação pelo R&B, um gênero com profundas raízes na cultura negra, é sintomática de um problema maior: a incapacidade de muitos consumidores de reconhecer e valorizar a história e a evolução musical.

Na era do pop descartável, onde tudo precisa ser “uma farofa para hitar”, o valor intrínseco da música se perde. Essa mentalidade não apenas empobrece o cenário cultural, mas também é adoecedora para os artistas, que se veem compelidos a sacrificar sua visão e integridade em prol de um sucesso efêmero. A arte deveria ser uma expressão genuína e não uma mercadoria moldada para agradar a todos indiscriminadamente.

Normani, ao honrar influências como Janet Jackson e ao insistir em seguir seu próprio caminho artístico, desafia essa narrativa tóxica. Sua coragem em lançar um álbum que reflete sua verdadeira essência deve ser celebrada e não criticada por não se conformar aos padrões do mainstream.

Essa situação nos leva a um questionamento crucial: estamos realmente apreciando a música ou apenas consumindo produtos pré-fabricados que nos são empurrados pela indústria? E, mais importante, estamos dispostos a abrir nossas mentes e corações para a diversidade musical, reconhecendo o valor dos diferentes gêneros, mesmo aqueles que não estão no topo das paradas?

Convido os leitores a refletirem sobre isso. Precisamos reavaliar nossos critérios de apreciação musical e apoiar a verdadeira arte em todas as suas formas. Afinal, a beleza da música reside em sua capacidade de transcender o tempo e as tendências, tocando as almas de gerações. É hora de devolvermos à música o respeito e a admiração que ela merece, celebrando a autenticidade e a diversidade que cada artista traz ao mundo.

Foto: Reprodução/Instagram

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Criado por Jadson Nascimento

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